Súmula 440 STJ - Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito.

Autor: Marcel Figueiredo Gonçalves.

Comentários: no Brasil, temos três regimes de cumprimento de pena privativa de liberdade:

  • Regime fechado;
  • Regime semiaberto;
  • Regime aberto.

O sistema de cumprimento de pena adotado no Brasil é o chamado "sistema progressivo". Segundo este, a pena deverá ser cumprida de forma a, progressivamente, dar ao condenado a possibilidade de, por seus méritos e critérios cumpridos, mudar de regime de pena. Do regime mais gravoso de cumprimento de pena, passa-se ao menos gravoso: do fechado, vai para o semiaberto; e do semiaberto vai para o regime aberto, até que se finde seu cumprimento de pena.

A intenção deste sistema é, efetivamente, dar ao preso condições paulatinas de ir se adequando à vida em sociedade. Em termos claros: o cárcere não é a rua, a rua não é o cárcere. São realidades absolutamente distintas e, por uma questão até mesmo lógica, para se ressocializar alguém, há que se dar a oportunidade de se viver em sociedade. Então, ir dando ao preso a possibilidade de contato social e lhe mostrando a necessidade de respeito às regras ali vigentes é algo crucial para sua reinserção.

As regras para progressão de regime estão previstas na Lei de Execução Penal (LEP), e aqui não nos interessam no momento. O que nos importa é saber que o condenado, evidentemente, deverá iniciar sua pena em algum destes três regimes. Sabendo isso, precisamos saber como o Juiz fará esta escolha do regime inicial. As regras a serem seguidas pelo Juiz estão no §2º do art. 33 CP:

§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso:

a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado;

b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto;

c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.

Ou seja, percebe-se que, para se decidir sobre o regime inicial de cumprimento de pena, a lei diz que dois critérios deverão ser observados:

  • O tanto de pena que o condenado recebeu;
  • Se este condenado é primário ou reincidente.

Entretanto, não são estes os únicos critérios a serem observados pelo Juiz. Veja o que diz o §3º deste mesmo art. 33 CP: § 3º - A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código.

Então, além da quantidade de pena e da reincidência, o Juiz deverá observar os critérios existentes no art. 59 CP, que são:

  • Culpabilidade;
  • Antecedentes;
  • Conduta social;
  • Personalidade do agente;
  • Motivos do crime;
  • Circunstâncias do crime;
  • Consequências do crime;
  • Comportamento da vítima.

Como já estudado, quando analisamos a súmula 719 STF, estes critérios do art. 59 CP poderão se sobrepor aos critérios da quantidade de pena e de reincidência do condenado, desde que o Juiz deixe isso bem claro. Isto é: se o Juiz verificar que os critérios do art. 59 CP são desfavoráveis ao condenado, poderá aplicar a ele um regime de pena inicial mais severo do que aquele que seria permitido pela quantidade de pena recebida. Exemplo: João, que é primário, foi condenado por 5 anos de reclusão, pelo crime de roubo. Em princípio, o regime inicial que João receberia seria o semiaberto, já que João não é reincidente e sua pena está entre 4 e 8 anos. Acontece que o Juiz considerou, em seu caso, que a conduta de João foi muito grave, que a vítima sofreu bastante, que a conduta social de João não é nada boa etc. Assim, o Juiz pode aplicar a João o regime inicial fechado (e não o semiaberto), desde que fundamente e explique exatamente o porquê de estar assim decidindo, ou seja, desde que traga uma motivação (fundamentação) idônea (adequada, suficiente ao caso).

E o que a súmula 440 STJ diz?

O Juiz de Direito, quando está fazendo a dosimetria da pena, passará por três fases: 1ª) cálculo da pena-base; 2ª) análise das agravantes e atenuantes; 3ª) cálculo das causas de aumento e de diminuição de pena.

O primeiro cálculo que terá que fazer é escolher entre o mínimo e o máximo de pena a ser aplicada. Exemplo: o crime de furto traz uma pena de 1 a 4 anos de reclusão. Assim, para este caso, o Juiz terá que escolher entre 1 e 4 anos. Como fará isso? Usará dos critérios previstos no art. 59 CP.

O Juiz terá que dizer que a personalidade do agente, por exemplo, é a ele prejudicial por este e por aquele motivo, ou seja, terá que fundamentar cada uma destas circunstâncias do art. 59 de forma expressa na sua sentença. Quanto mais positivos forem os critérios, mais o Juiz se aproximará do mínimo de pena (1 ano, no nosso exemplo de furto). Quanto mais prejudiciais ao réu, mais se aproximará do máximo (4 anos). Não há um percentual previsto em lei, e não há um cálculo obrigatório a ser seguido pelo Juiz. É ele, dentro de sua liberdade de julgar, que irá fazer suas aproximações ao mínimo ou ao máximo da pena, é ele quem fará sua própria fórmula matemática.

A isso tudo se chama "pena-base". É o "pano de fundo" sobre o qual o Juiz, em momento posterior, irá acrescer ou retirar mais pena ao condenado.

A súmula 440 STJ vem dizer que: caso o juiz tenha considerado, neste cálculo da pena-base, que as circunstâncias do art. 59 CP são predominantemente favoráveis ao condenado, não poderá ele, na hora de escolher o regime inicial, dizer que irá aplicar um regime de pena mais severo que aquele permitido de acordo com a quantidade de pena (do §2º do art. 33 CP). Isso porque seria ilógico: se ele já considerou que o art. 59 CP é predominantemente favorável ao condenado, assim deve continuar dizendo em outras fases de sua decisão, inclusive quando da escolha do regime inicial.

Além disso, o juiz não poderá, numa tentativa ainda de aplicar um regime inicial mais severo que o permitido pela quantidade da pena, alegar a gravidade em abstrato do crime como fundamento para a sua decisão. Exemplo: João foi condenado por tráfico de drogas. João é primário e recebeu uma pena de 7 anos de reclusão. Em princípio, João teria que iniciar seu cumprimento de pena no regime semiaberto, já que não é reincidente e sua pena está entre 4 e 8 anos. Mas o Juiz, em sua sentença, diz que o regime inicial será o fechado, tendo em vista que o tráfico de drogas é um delito equiparado a hediondo e que traz grandes mazelas sociais. Veja que o Juiz se baseou não na situação concreta de João, não olhou os requisitos do art. 59 CP nem descreveu o porquê concreto de estar aplicando um regime mais severo. Baseou-se apenas na ideia geral e abstrata de que o tráfico é algo grave. Sim, é algo grave, tanto é que é tido como crime equiparado a hediondo, mas, para aplicar a João, especificamente, um regime mais severo, o Juiz deverá especificar exatamente o porquê de ser João merecedor deste regime. A proporcionalidade aí deve ser concreta, não abstrata. E, já tendo considerado as circunstâncias do art. 59 CP como favoráveis, isso não será mais possível.

É isso que diz a súmula 718 STF, já estudada por nós[1], e é isso que a súmula 440 STJ vem aqui repetir.

NOTAS:

[1] Este estudo da S. 718 está na análise da S. 719 STF, por serem súmulas que se complementam.