Súmula 533 STJ - Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal, é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional, assegurado o direito de defesa, a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado.

Autor: Marcel Figueiredo Gonçalves.

Comentários: um dos pilares da execução penal é, indubitavelmente, a disciplina no cumprimento da pena. A lógica é simples: se o indivíduo ali está cumprindo pena significa dizer que uma regra grave (de natureza criminal) fora por ele desobedecida, logo, a este sujeito deve ser ensinado o cumprimento de normas. Se isso funciona ou não, se é uma ideia meramente abstrata ou não, por ora, deixaremos de lado. O certo é que, como consta no art. 1º da Lei de Execução Penal (LEP), um dos objetivos da pena é a reintegração, o convívio social futuro, logo, aprender a obedecer às normas seria um dos passos mais importantes para tanto: art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado[1].

Neste sentido, a própria LEP traz regras a serem obedecidas durante o cumprimento da pena. Estão elas elencadas, especialmente, no art. 49 e seguintes desta lei, além de outros dispositivos legais. Por exemplo: comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que incitar ou participar de movimento para subverter a ordem ou a disciplina.

Uma vez cometida uma falta, evidentemente, haverá a aplicação de uma sanção, uma consequência que prejudicará o seu infrator agora ou futuramente. Poderá, por exemplo, regredir de regime ou ter negado, futuramente, algum benefício, por não ter tido bom comportamento.

A LEP classifica as faltas em leves, médias e graves. Assim diz seu art. 49: Art. 49. As faltas disciplinares classificam-se em leves, médias e graves. A legislação local especificará as leves e médias, bem assim as respectivas sanções[2]. Então, caberá a cada lei estadual definir o que entende por falta leve e média e trazer a respectiva sanção. Já quanto às faltas graves, a própria LEP já as traz e, também, elenca as respectivas sanções. Em geral, para estas faltas graves é aplicado o art. 53 LEP:

Art. 53. Constituem sanções disciplinares:

I - advertência verbal;

II - repreensão;

III - suspensão ou restrição de direitos (artigo 41, parágrafo único);

IV - isolamento na própria cela, ou em local adequado, nos estabelecimentos que possuam alojamento coletivo, observado o disposto no artigo 88 desta Lei.

V - inclusão no regime disciplinar diferenciado.

Muito bem, e o que a súmula em pauta diz? Simplesmente que, para a aplicação de qualquer sanção disciplinar, seja por falta leve, média ou grave, deverá haver a instauração de um procedimento administrativo. Este procedimento deverá respeitar o contraditório e a ampla defesa, sendo obrigatória a presença de um advogado particular ou Defensor Público (para os que não possuem condições financeiras). Será a autoridade administrativa quem irá instaurar este procedimento, e esta autoridade é o Diretor do Estabelecimento, seja este um presídio, uma cadeia, um centro de detenção provisória etc.

Será o próprio Diretor quem irá instaurar o procedimento e, caso seja comprovada a culpa do acusado, irá aplicar a respetiva sanção. As sanções para faltas leves e médias (aquelas que serão previstas na lei estadual) serão todas aplicadas por ele. Já para as faltas graves (as previstas na LEP), deverá o Diretor, após tomar as medidas que lhe cabe, comunicar o fato ao Juiz da Execução Penal competente, para que este, sendo o caso, aplique aquelas sanções que somente a ele cabe aplicar (reserva de jurisdição). Cabe apenas ao Juiz, por exemplo, aplicar a regressão de regime, revogação de saída temporária, perda dos dias remidos, inclusão no Regime Disciplinar Diferenciado e conversão da restritiva de direitos em privativa de liberdade. Não sendo o caso de haver estas sanções, é o Diretor quem irá aplicar as demais.

A súmula, portanto, vem apenas garantir que seja dado ao preso (que agora está sendo acusado por falta disciplinar) o direito a um processo administrativo justo e democrático, ou seja, aquele que garante a sua defesa por todos os meios legais disponíveis. A súmula vem rechaçar, para o caso de procedimento disciplinar na execução penal, a aplicação da súmula vinculante 5, que assim diz: A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição.

Esta súmula vinculante é sim válida e aplicável para todos os procedimentos administrativos disciplinares, salvo os que ocorrem em contexto de execução penal. Isto é, se o acusado em um procedimento disciplinar não quiser se valer de um advogado, poderá assim proceder. Mas, se este procedimento for em contexto de execução penal, a presença do advogado é obrigatória. Isso porque estamos diante de bens indisponíveis e fundamentais que estão em jogo (como a liberdade de ir e vir), além de haver o interesse público-coletivo no correto cumprimento da pena. Ou seja, não se trata apenas de interesse do acusado de ter ou não sua defesa garantida, sendo interesse de toda a sociedade que a execução penal alcance seus fins de punição e reintegração social. Para que isso ocorra, deve ser observado um maior cuidado e zelo na aplicação das sanções disciplinares, daí que se obriga a presença de um advogado.

Em suma, se uma falta (de qualquer grau) for praticada por um condenado, a ele será aplicada uma sanção; para a aplicação desta sanção é obrigatória a instauração de um procedimento administrativo disciplinar por parte do Diretor do local; neste procedimento, deverá haver a possibilidade de defesa do acusado, com presença obrigatória de advogado (particular ou público).

NOTAS:

[1] São inúmeras as críticas possíveis à ideia exposta neste parágrafo. Na maioria dos casos, a reintegração é, em si, uma falácia, pois se refere ela a pessoas que sequer foram integradas socialmente, logo, o "re-integrar" seria algo, no mínimo, mentiroso e enganador. Não obstante, o ser humano possui, como desde sempre possuiu, um grau de liberdade em seu agir, logo, há que ser responsabilizado, sim, por seus atos. De forma alguma, isso significa o uso do Direito Penal como primeira forma de responsabilização, mas, sem dúvida, é ele ainda uma forma necessária para os casos mais graves.

[2] Este artigo está de acordo com a Constituição Federal, que diz que tanto União como Estados poderão legislar sobre questões penitenciárias. É o art. 24, I CR que assim diz: Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico.