Súmula 606 STJ - Não se aplica o princípio da insignificância a casos de transmissão clandestina de sinal de internet via radiofrequência, que caracteriza o fato típico previsto no art. 183 da Lei 9.472/1997.

Autor: Marcel Figueiredo Gonçalves.

Comentários: o funcionamento das telecomunicações obedece a um controle por parte do Estado brasileiro. Aqueles que trabalham com esta função devem ser registrados e devem cadastrar suas atividades. Neste caso, o cadastro e controle são de maior interesse coletivo. Isso porque, a transmissão desordenada e sem controle pode gerar interferência em importantes áreas sociais, como sistemas de hospitais, polícias, bombeiros, aeroportos, até os sinais de rádio e televisão domésticos adjacentes à transmissão clandestina.

Assim, para o funcionamento de um setor de telecomunicação (como uma rádio) deve haver autorização prévia da ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações), uma vez que o monopólio no controle das telecomunicações pertence à União. Essa agência federal, se possui todas as atividades registradas, poderá, sobre elas, ter o devido controle para casos de pane, questões técnicas complexas e, até mesmo, eventuais responsabilizações por danos causados.

E o que a súmula 606 STJ tem com isso?

Uma das formas de se ter o funcionamento de um sinal de internet é por meio de radiofrequência. Em muitos locais interioranos e longínquos, a internet é um problema, não havendo sinal bom e suficiente para o adequado funcionamento. Assim, em alguns locais, utilizam-se das ondas de rádio para, por meio de sua captação, trazer o sinal para os computadores, "transformando-os" em sinal de internet. Ondas de radiofrequência carregam o sinal até o computador. É a chamada "internet via rádio".

Desde que devidamente autorizado e registrado, este serviço é legal e pode ser feito normalmente. Contudo, caso não haja esta autorização, os envolvidos estarão fornecendo um serviço que, como visto, traz riscos ao adequado controle e funcionamento das telecomunicações. Trata-se de atividade, portanto, clandestina e ilegal. E onde estaria a ilegalidade neste caso? No art. 183 da lei 9.472/97, que assim diz:

Art. 183. Desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação:

Pena - detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, e multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, direta ou indiretamente, concorrer para o crime.

Tendo em vista o parágrafo único acima descrito, entendemos que tanto aquele que fornece o serviço como aquele que faz uso das redes clandestinas de rádio devem responder por este art. 183. Então, ao se contratar uma empresa que forneça tais serviços, o consumidor deverá se atentar para a autorização que ela deva possuir, a fim de não incorrer neste crime.

Mas, não é só isso que a súmula 606 STJ vem dizer.

Segundo esta súmula, a este crime não se aplica o princípio da insignificância. Um acusado por este crime poderia alegar, por exemplo, que ao derredor da transmissão clandestina das ondas de rádio não há qualquer hospital, polícia, emissor de rádio e TV etc. Ou seja, quer alegar que se trata de um local ermo e que as ondas emitidas por sua torre transmissora clandestina não colocam em risco o funcionamento adequado das telecomunicações (ou é um risco muito baixo) e que, por isso, aplicar-lhe uma sanção criminal seria desproporcional e irrazoável. Em nome de uma intervenção mínima do Direito Penal, nós concordaríamos com esta tese, mas, o STJ não compactua com a ideia. E por que não?

Para o STJ, o crime do art. 183 da lei 9.472/97 é um crime de perigo abstrato. Isto é, a lei traz uma presunção absoluta de que, uma vez praticado aquele ato, há lesão ao bem jurídico protegido (segurança das telecomunicações), independentemente do que venha a ocorrer no caso concreto. É o mesmo que ocorre, por exemplo, com o crime de embriaguez ao volante. Não adianta ao condutor do veículo querer provar que estava dirigindo seu carro com prudência, ainda que embriagado, pois a lei traz, como presunção irrefutável, que a segurança viária estava em risco.

Assim pensa o STJ e assim diz sua súmula 606 quanto ao crime de desenvolvimento clandestino de atividade de telecomunicação.